César Becker, Gabi, João Diniz, Luciana Ferreira, Luciana Glapas, Mari Velasco, Marina Mendes da Rocha, Antonio Obá, Paula Estellita, Rodrigo D'Alcântara, Tiago Macini, Victor Proa, Yasmin Adorno: Matéria errante
20/8/17




A segunda edição do Laboratório de processo criativo da Nave1 traz ao deCurators2 o processo de trabalho dos 13 artistas que se dedicaram às propostas e provocações apresentadas durante quatro meses de experiências compartilhadas.

A fim de estimular e ampliar os campos de ação relativos aos projetos de cada artista que compõe este grupo, o Laboratório se propôs a ser um espaço de trocas e contaminações entre processos distintos, mas muitas vezes convergentes. Desde o ano passado, o deCurators acolhe generosamente os frutos dessas experiências. César Becker, Gabi, João Diniz, Luciana Ferreira, Luciana Glapas, Mari Velasco, Marina Mendes da Rocha, Obá, Paula Estellita, Rodrigo D’Alcântara, Tiago Macini, Victor Proa e Yasmin Adorno mostram nesta exposição parte do que experimentaram coletivamente.

Com o intuito de poder tornar-se mais um espaço de interlocução para a produção artística da cidade, o Laboratório de processo criativo propõe a cada edição um novo roteiro que visa enriquecer os processos que atravessam o trabalho de cada artista. A análise coletiva de trabalhos e portfolios, os exercícios e experiências de imersão em outros espaços foram algumas das atividades que buscaram ampliar as possibilidades construtivas e as trocas poéticas em grupo.

Matéria errante traduz a proposição inicial do curso: pensar os trabalhos a partir de sua condição material no tempo e no espaço no qual se inserem. Pensar sobre os estados da matéria envolveria, assim, pensar também sua configuração em termos de densidade, dispersão, peso, leveza, dureza, opacidade, duração e transitoriedade. E ainda sobre sua capacidade de transitar entre outros estados – formas por vezes informes – mediante a ação de forças circunstanciais, internas e externas. O desafio proposto foi justamente tentar compreender a materialidade das ideias que já atuavam como envoltório da produção de cada um, orientando nosso olhar na direção das coisas que poderiam então dar corpo e forma a essas questões.

Trata-se, de fato, de um trabalho de constante construção e desmanche. Compor, desmanchar, recompor utilizando outras combinações possíveis. E não seria essa uma das características da linguagem? Compor e recompor as coisas do mundo, a matéria em constante fluxo e mudança de configuração diante das forças que sobre ela atuam?

A ideia era que pudéssemos, a partir dessa provocação, evitar a literalidade das palavras em tempos de pensamentos binários. Evitar o dualismo que não compreende as coisas que se situam “entre”.  A expulsão da pluralidade, da multiplicidade na ordem dos discursos produz também consequências para a produção de sentido. A linguagem, em geral, se ressente da falta de complexidade – penso eu.

Dessa maneira, “Matéria errante” propõe que olhemos para estes trabalhos segundo uma perspectiva na qual podemos identificar na terra, no(s) corpo(s) e na(s) história(s) a materialidade em fluxo contínuo, partes dispersas que se combinam formando totalidades efêmeras. Perceber o murmúrio das coisas que podem ser contidas e das que não podem, escapam, fogem. Na errância – nos percursos marcados por mudanças de rota, na transitoriedade ou na falta de um destino predeterminado e seguro – talvez resida nossa única afirmação como certeza coletiva. Entre estados sólido, líquido e gasoso compreende-se uma gama de processos e forças externas que determinam transições e a forma (ou a aparente falta de forma) dos objetos no mundo.

Terra [espaço  paisagem  totalidade  tempo  deslocamento]; corpo [pele  percursos  contato  outrx  vida/morte] e história(s) [coletivo  construção  memórias  esquecimentos  apagamentos fluxos] foram os campos propostos como possíveis imagens para pensarmos a adequação material das poéticas de cada um, sua forma de vida ou sua morada provisória até a próxima travessia.  Que possamos nos dispor a fazer sendas e atravessar esses caminhos transitórios sempre em boa companhia.

Yana Tamayo




1    Gerida por Yana Tamayo, Dani Estrella e Cecília Bona, a Nave arte|projeto|pesquisa foi criada em 2015 como espaço dedicado à formação, execução de projetos e exposições, curadoria e pesquisa em artes visuais. O Laboratório de processo criativo é um grupo de estudos dirigidos criado para o acompanhamento crítico de projetos artísticos que em sua primeira edição teve a orientação de Cecília Bona e Yana Tamayo, culminando com uma exposição no deCurators ao fim do ano. A segunda edição do grupo, conduzido apenas por Yana, teve a duração de quatro meses, um mês a mais que o primeiro, e algumas das propostas iniciais reformuladas de acordo com o contexto e necessidades do novo grupo.

2    deCurators é um espaço sem agenda fixa, pensado como uma vitrine para exercícios de curadoria. Localizado em Brasília, o espaço experimental de microcuradorias é gerido por Gisel Carriconde e Phil Jones desde 2014. No lavabo do espaço lê-se “Os 5 mandamentos deCurators: Transitório como uma vitrine / Em construção, em ebulição, sempre De/entre/como/para/sobre/por / Que seja inútil, inútil e ainda inútil / E não está à venda”.