João Trevisan: Descarrilho
curadoria de Atila Regiani
10/8—6/9/18
João caminha na trilha férrea ao lado de sua rua. Entre dormentes de madeira desgastadas; trilhos e peças do abandono, gastas, enferrujando… A passagem do tempo deita estruturas poéticas que lhe apegam e alumbram os sentidos numa procura voraz não só estética. É mais!
Seu caderno não só de anotações visuais e textuais muito bem urdidas nos desenhos e nos conceitos, nos expõe o conhecimento da força densa da madeira e do ferro que ele recolhe em curiosas caminhadas para acolher a “tensão entre dois pontos”: equilíbrio x desequilíbrio; dobráveis x desdobráveis em infinitas disposições entre o ser do visível e do invisível.
As articulações estruturais desenhadas como o mesmo esmero do grafismo em seu desenho, nos apontam que peso, densidade e leveza, dialogam com o espaço e matéria propondo conviver com formas mutantes e com um olhar desafiador de quem atento, possa mais do que ver.
João tem intuição e erudição com mesmos pesos ligando a matéria à poesia com justeza e acuidade. Presta atenção a este corpo da matéria que sofre com o tempo e que corre não só sobre a superficie de ferro em que se recebe peso e tensão do trem que duas vezes passa ao dia para levar não só a carga alçada ao destino. Leva também o que todo menino eterno assiste lá de dentro do imaginário e que não se diz só por paixão e palavras.
Lembro que Milton Nascimento, como bom mineiro, desenhou como um menino um trem no trilho e no sol das Geraes e usa-o como símbolo de seus discos. João de similar paixão, professa o alfabeto da memória de destinos, engates e desgastes para formatar com precisão cientifica seus consequentes desdobraveis efêmeros.
Caminhei com eles num fim de tarde por estes trilhos vizinhos e pode testemunhar seu alumbramento por estas matérias sem a qual não se faz da arte e da vida, a unidade.
Madeira e ferro, solidão e coragem, materia e impermanênia, dão forma a uma obra singular que quer e pensa a mutabilidade como o trem que se articula maleavel e musical cheio de ritmos em vagões, equilibrando-se elegante, voraz e fugaz sobre trilhos, trilhas que nunca tem fim...
João já é sábio desta arte poética do infinito/finito em equilibrio e tensão, portanto tem sabedoria da eternidade, agora!
Bené Fonteles
© Jean Peixoto