Carlos Lin: TramaTempo
curadoria de Marília Panitz
30/7—20/8/21




Homem plantado na terra olha o céu, a pele do mundo. A posição é horizontal (maior superfície de contato). Meio fauno, meio artífice, o artista. O som pode ser o das árvores, das plantas que se mexem ao seu contato... ou um mugido (em um possível tributo a Georges Bataille, à horizontalidade, à animalidade do humano).

Carlos Lin assentou a poesia de sua obra nessa conversa (infinita) com a natureza (a quem segreda pequenas coisas pelos buracos na terra, enquanto cuida de seu jardim). Desde seus trabalhos, cuja base era o papel artesanal de fibra natural, que ele também confeccionava, ao work in progress (que me parece também infinito, que assim seja!) do registro obsessivo das flores aliado a um texto narrado entre a observação de dois seres (ele/ela, ele/ele, ela/ela) que repercutem o mundo contemporâneo e rotineiro lá de sua origem vegetal – publicado diariamente no Instagram – a matéria prima está ao redor, no cerrado... Nas séries de desenhos “botânicos”, e na sequência de trabalhos em fotografia e vídeo que ele vem desenvolvendo há anos (d’A Pele do Mundo ao Projeto Casa, e aos vídeos de Percaminhos e Átimo) a questão central está no tempo lógico (sagrado) da natureza, longe de nossa cronologia... exercício de respirar devagar.

O projeto atual do artista é a trama. A descoberta, em suas caminhadas exploratórias diárias, no amanhecer, da palmeira azul e sua magnifica palha, gerou uma artesania de receptáculos em cestaria (muito particular) que orienta seus novos trabalhos. Em paralelo, uma pesquisa com Lino Valente, tem produzido as vídeo-performances do Quadrúpede. Associando as duas pesquisas, surgem algumas formas “vestíveis” (elmos, guirlandas, casulos) que recebem, na maior parte do tempo, o “vazio que se chama Coisa”, como nos adverte Lacan, seguindo Freud e o Platão da metáfora do oleiro (outro artífice). E não é esse o papel da arte? Contornar o incontornável? Dar forma ao insondável?

Na visita a TramaTempo, somos introduzidos, em primeira mão, a uma instalação de possíveis recipientes e suas generosas formas-para-algum-nenhum-conteúdo, suspensas no ar, sobre uma base de bambus e esféricos melõezinhos do cerrado já secos (continentes forjados pela natureza, assim como as cabaças que se misturam aos casulos de palha). Ao fundo está o vídeo do AntiNarciso, o emblemático selvagem comedor da natureza (um mito às avessas, como um touro, talvez). Essa é a vitrine, primeira parte da mostra.

Dentro da galeria, três vídeos e o grande casulo exemplar, confeccionado com círculos que emulam peneiras, mas com um tramado quase caótico que é desenho (o artista é um desenhista metódico, não nos esqueçamos). O vazio e a penumbra do espaço nos catapulta para dentro de um outro recipiente: o espaço expositivo (que nos remete ao outro, o da pele do mundo, onde – ainda – existimos).

Marília Panitz



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